Peço licença aos meus leitores para utilizar este espaço para homenagear o cara que me fez o que eu sou hoje: meu pai.
“Seu” Ivan herdou a sua vascainidade de seu pai e de seu avô. Portugueses migrantes da região de Viseu (de uma pequena cidade portuguesa chamada Penalva do Castelo), vieram para o Brasil no início do século passado para tentar uma vida melhor e logo adotaram a instituição que melhor os representava no Rio de Janeiro.
Como é da tradição do nosso clube, foram bem acolhidos e dele se serviram para passar ao brasileirinho carioca nascido em 1937, fruto de uma paixão avassaladora do velho “portuga” José por uma mulata tipicamente brasileira (minha saudosa avó Laura…), os valores de igualdade e democracia e o espírito vencedor da Cruz de Malta.
Meu pai ainda teve o imenso prazer de ver o Expresso da Vitória de perto! De muito perto mesmo… Fora levado para jogar bola no seu clube do coração por nada menos que seu padrinho: Danilo, o “Príncipe”! Teve contato com todos aqueles heróis que formaram aquele que viria a ser o primeiro grande time brasileiro. Teve grandes alegrias com inúmeros títulos cariocas e o inesquecível Campeonato do Campeões Sul-americanos em 1948.
Jogava na posição que hoje chamamos de “meia atacante”. Um clássico “camisa 10”. Chegou a jogar nas divisões de base, mas contusões mal curadas e o seu interesse pela mecânica acabou por levá-lo para outros caminhos, mas sem nunca abandonar o seu Vasco. Continuou disputando partidas e campeonatos amadores, sempre como “a” referência do time. O cara que era o primeiro escolhido no “par ou ímpar”.
A juventude passou, veio casamento com uma menina das “coxas grossas” (minha mãe ao ler isso, vai me matar… rsrsrsrs) e fruto desse amor nasceram minha irmã e finalmente eu em 1968. Numa época terrível para o nosso clube. Mas logo dois anos depois, e meu “velho” pode gritar “É Campeão!!” novamente. Prenúncio de bons ventos com a chegada do filho varão, nas palavras dele.
Já contei por aqui, mas vale repetir: por influência de primos da mesma idade, quase virei botafoguense. Meu pai, respeitando os valores que recebeu no clube onde fora criado, em nada me influenciou mas estrategicamente me levou ao jogo em que minha vascainidade nasceria. Naturalmente. No meu sangue corre o sangue português de meu avô paterno, com o negro de minha avó materna. Tinha como eu torcer para outro time?!?!
Entrei no Maracanã botafoguense e saí vascaíno (e Campeão Brasileiro) até a última célula do meu corpo. Ele nega, mas eu tenho certeza de que esse deve ter sido o dia mais feliz da sua vida…
Foram muitos e muitos jogos com o meu “velho”… No Maracanã, em São Januário, em Moça Bonita, no Ítalo del Cima, na Rua Bariri, na Rua Teixeira de Castro, em Coselheiro Galvão… Era o meu programa predileto!! Anos de vitórias!! De títulos!!! De mais um período maravilhoso do nosso clube que eu pude presenciar sempre ao lado dele…
O tempo passou e eu não sei exatamente em que momento e nem o motivo, mas ele perdeu o interesse… Raramente nos dias atuais vai aos jogos e se limita a ver os jogos pela TV, quando não há nada mais interessante para fazer… Curiosamente, nosso clube passa por um período terrível.. 15 anos de pouquíssimas conquistas, dois rebaixamentos e um terceiro em vias de acontecer…
A fase é terrível, mas sempre após os jogos, nos falamos, e é a voz dele que me acalma, que me faz lembrar os períodos de ouro por que passamos juntos… Sempre no fim de nossas conversas: “Filho… Não fique assim… Vai passar… Vai passar…”
Pai: muito obrigado por tudo que vivemos. Muito obrigado por me fazer amar esse clube inigualável. Esse clube que mostra que nunca nada é fácil na vida. Que é nos momentos de desesperança que ele surge mais forte que nunca.
É por você que eu tento hoje passar à Gabi os ensinamentos de bondade, honestidade, igualdade que o nosso clube tanto preza. De que vale uma vitória se ela não for conquistada com lisura?
Aceite hoje, no seu dia, um abraço e um beijo desse seu filho que te ama. Desculpe-me por qualquer coisa e continue essa pessoa maravilhosa. Tenho certeza de que ainda vamos comemorar muitos e muitos Dias dos pais e muitas e muitas vitórias do nosso Vascão!!
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Dia dos pais… Domingo de sol e calor nesse falso inverno no Rio de Janeiro. Jogo às 11h no Maracanã contra o “saco de pancadas” (o outro…) do campeonato. Depois de 11 dias de descanso e treinos. Tudo para uma vitória que nos traria algum alento…
Mas faltou combinar com o Herrera… Com Celso Roth… Com o “messias”…
Malditos! Quase conseguiram estragar o meu domingo…
Um time mal escalado, por um técnico mal contratado, por um “presidente” equivocadamente eleito…
Herrera? Por que escalá-lo?
Por que manter Anderson Sales no meio quando nosso zagueiro titular contundiu-se? Por que escalar um zagueiro que não jogava há séculos tendo um zagueiro que joga improvisado, sabe-se lá porque, no meio campo e um volante de ofício na reserva (Lucas)? Por que a insistência em manter por inúmeros jogos um (ex)lateral esquerdo no meio quando temos um meio campo de ofício no banco (Julio dos Santos)? Por que mandar embora ou deixar ir embora (tanto faz!) o nosso melhor atacante para agora termos que aguentar o Herrera?
Se nem com todas as condições favoráveis, diante de mais de 41 mil pessoas, conseguimos vencer o igualmente fraquíssimo Joinville, parece-me que nosso destino está selado…
Espero estar errado e que algum milagre aconteça…
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Ainda sobre o Herrera, minha filha descobriu o motivo de sua vocação para perder gols…
“Papai… O problema é o nome dele: “Erreira”! Se fosse “Acerteira”, ele seria artilheiro!”
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Voltando do Maracanã, com aquele “gosto de cabo de guarda-chuva” por conta desse maldito empate, fico curioso e pergunto para minha filha:
“Gabi, por que você gosta tanto do Vasco?”
“Ué… Por que a pergunta pai…? Você também não gosta?”
“Sim, filha… Mas para mim foi até fácil virar vascaíno… Eu sou de uma época em que o Vasco ganhava tudo!”
“Pai, claro que vencer é ótimo, mas o Vasco é muito mais do que isso. Um amigo da escola me disse que o Vasco foi o primeiro clube a aceitar negros, né…?”
“Sim, mas…”
“Então? Sou vascaína não só pelas vitórias, mas sim pelo que o Vasco é.”
“Então tá…” Encerrei a conversa com o peito estufado de orgulho e com uma lágrima teimando em cair do meu olho…