Para evitar bobagens: as pesquisas de opinião e afirmação a respeito dos mais diversos temas são realizadas em todo o mundo, de modo que poderiam funcionar perfeitamente no Brasil, através de amostras cientificamente eficientes, não fosse por um pequeno detalhe.
Interesses ocultos ou claros.
É assim nas análises políticas, no marketing e agora, nos últimos tempos, caso do futebol.
Por exemplo, uma pesquisa servir para referendar tendências e a explicação de investimentos, caso da clara espanholização no esporte bretão.
Por aqui, não é possível realizar hoje uma série histórica de resultados que tenha desempenho científico comprovado. Motivo: todas as anteriormente realizadas foram por mais de um instituto, cada uma com método diferente. Equivale a pesar maçã, mamão e manga com preço de fruta de conde.
Natural em que num país do tamanho do Brasil, praticamente um continente, fazer esse tipo de investigação é algo bastante caro e que exige estrutura.
Ontem, o diário Lance divulgou seus dados, apurados pelo Instituto Datafolha.
Clubes Participação Em milhões de torcedores
1º – Flamengo 16,2% 32,5
2º – Corinthians 13,6% 27,3
3º – São Paulo 6,8% 13,6
4º – Palmeiras 5,3% 10,6
5º – Vasco 3,6% 7,2
6º – Atlético-MG 3,5% 7,0
7º – Cruzeiro 3,1% 6,2
8º – Grêmio 3,0 % 6,0
9º – Internacional 2,8% 5,6
10º – Santos 2,4% 4,8
11º – Fluminense 1,8% 3,6
12º – Bahia 1,7% 3,4
12º – Botafogo 1,7% 3,4
14º – Vitória 1,3% 2,6
15º – Atlético-PR 1,2% 2,4
16º – Sport Recife 1,2% 2,4
17º – Santa Cruz 1,0 % 2,0
18º – Ceará 0,8% 1,6
Chama enorme atenção o rol de disparidades apontadas nos dados. Sabe-se que uma das principais características de início dos pequenos torcedores nos estádios é por meio do ambiente familiar. Dificilmente um pai vascaíno vestirá seu bebê com as cores da Gávea, por exemplo. Nos anos 50 (início do Maracanã), o Vasco tinha a liderança da torcida carioca e até nacional. Seis décadas depois, ficou 4,5 vezes menor do que o rival rubro preto de acordo com os dados acima. Uma investigação a respeito poderia esclarecer o mistério. Talvez algum lunático possa dizer que milhões de torcedores “viraram casaca” no decorrer das décadas. Rirei.
Com todo respeito ao time do Morumbi, detentor de grandes conquistas no futebol brasileiro, é difícil intuir que tenha quase o dobro de torcedores do Vasco. São Januário tem historicamente fortes núcleos de torcida em vários lugares do país, especialmente no Nordeste. Mesmo com os anos mais difíceis do Vasco e os melhores do São Paulo, é importante lembrar que os torcedores já consagrados de décadas passadas, uma vez vivos, tendem a não ter mudado de time.
O Cruzeiro menor do que o Atlético hoje? O Atlético igual a Fluminense e Botafogo juntos hoje? O Atlético-PR maior do que o Santa Cruz hoje? A conferir.
Percebam: não estou utilizando números aqui. Não tenho uma pesquisa minha às mãos. Nem precisava.
A pesquisa teve concentração em São Paulo, com suas cidades compondo 29% do espaço amostral. Cerca de 40% dos bairros onde aconteceram as entrevistas dos torcedores ficam em municípios paulistas. Há quem diga, inclusive o diretor do Datafolha, que esse perfil não interfere nos dados por meio de ponderação. No entanto, parece claro que qualquer time entre os grandes do país tenha o grosso de sua torcida em seus arredores físicos. – Fulano, você torce para quem? – Flamengo? – Sabe dizer dois jogadores titulares de hoje? – Zico e Ronaldinho.
Reproduzindo o texto Lance! Ibope:
“A pesquisa LANCE! Ibope das maiores torcidas do país ganha relevância por sua abrangência. Além de ser realizada em todos os estados brasileiros, foram entrevistados mais de sete mil pessoas para o levantamento. Como comparação, pesquisas eleitorais de abrangência nacional são realizadas com cerca de três mil pessoas. Além disso, este estudo ganha relevância por ser realizada com jovens entre 10 e 15 anos, o que não ocorre em outras pesquisas. Dessa forma, o LANCE! Ibope indica as tendências de crescimento e queda das maiores torcidas do país. Nesta pesquisa foram ouvidas 7.005 pessoas. A margem de erro deste levantamento é de 1 ponto percentual para mais ou para menos. Essa pesquisa já foi realizada nos anos de 1998, 2001, 2004 e 2010. Os resultados desse levantamento serão publicados de hoje até o próximo domingo, 31, no LANCE! e no LANCE!Net.”
Algumas considerações
1) Não é o tamanho dobrado da amostra em comparação aos procedimentos de pesquisa eleitoral que vai garantir a consistência dos dados, mas sim a eficiência de seus estratos. Português barato: uma fatia de um bolo cortado, mesmo pequena, pode capturar todos os seus ingredientes. Um fatião horizontal de um metro de glacê, não;
2) O que significa na prática dizer que jovens de 10 a 15 anos foram pesquisados? Convém ressaltar que a paixão pelo futebol encontra-se em torcedores cujas faixas etárias vão da infância até a extrema maturidade;
Alguns dados interessantes reproduzidos no excelente blog Teoria dos Jogos (convém lembrar que a metodologia das pesquisas é diferente):
1) Ranking de torcidas Placar 1993
2) Instituto Gallup 1993
Olhando para os gráficos acima e a divulgação Lance!Ibope, a qual conclusão você poderia chegar a respeito do Vasco? Dobrou de tamanho ou perdeu torcida?
O resumo é de cada um.
Bem vindo ao mundo da ficção estatística.
@pauloandel
Bacharel em Estatística, Universidade do Estado do Rio de Janeiro, 1994